Os dados do primeiro semestre deste fatídico ano revelam que essa pandemia, que ceifou a vida de centenas de milhares de pessoas e que afetou drasticamente a economia da maioria dos países, ocasionou também diminuição na taxa de doação e transplante no país. Essa queda, no entanto, foi menos intensa que a observada em outros países, como Espanha e Estados Unidos. Entretanto, há dois aspectos dessa pandemia que devem ser observados, pois podem influir nas atividades de doação e transplante:
1.O pico de transmissão e de mortalidade da Covid não foi uniforme, no Brasil, tendo ocorrido nos meses de maio e junho, nas regiões Norte e Nordeste e parte da região Sudeste (RJ e SP) e, a partir de julho, nas regiões Sul e Centro-Oeste e em MG.
2.Embora o pico tenha ocorrido em algumas regiões, não houve, como em outros países, uma queda rápida nas taxas de transmissão e de morte em alguns estados, pressupondo a manutenção desse quadro por alguns meses, possivelmente, até o início da vacinação, talvez no final deste ano ou início do próximo.
A taxa de doadores efetivos, que chegou a 18,4 pmp no primeiro trimestre, próxima da projetada para este ano, em 2017 (20 pmp), caiu no semestre para 15,8 pmp, 6,5% menor que a do primeiro semestre de 2019. Comparando com aquele período, houve diminuição nas taxas de doadores efetivos nas regiões Norte (47,4%), Nordeste (37%) e CentroOeste (12,6%) e aumento nas regiões Sul (5%) e Sudeste (3,1%). Mas, se compararmos a taxa de doadores do primeiro trimestre (18,4 pmp) com a do segundo trimestre (13,3 pmp), observamos uma queda de 26,1%, o que é muito preocupante. Neste semestre, comparando ao primeiro de 2019, houve diminuição no número de transplantes de fígado (6,9%), rim (18,4%), coração (27,1%), pulmão (27,1%), pâncreas (29,1%) e, de forma mais acentuada, no transplante de córneas (44,3%), pela suspensão das atividades de grande parte dos serviços. Houve queda nos transplantes com doador vivo, tanto de rim (58,5%), quanto de fígado (23,6%), para evitar o risco do doador adquirir Covid, durante a internação, para o procedimento eletivo.
Com relação ao transplante renal, apenas três estados (SC, MS e GO) apresentaram aumento no número de transplantes neste semestre, além do MT, que reiniciou suas atividades. Com exceção dos estados da região Norte, que praticamente suspenderam os transplantes, os estados mais afetados foram RN, PE e CE. Analisando por região, apenas a CentroOeste apresentou pequeno aumento (2,2%) e houve queda importante na Norte (74,4%) e Nordeste (46,1%) e menor na Sul (3,1%) e Sudeste (17,2%).
O transplante hepático foi menos afetado que o transplante renal, tendo aumentado nas regiões Sudeste (4,5%) e Centro-Oeste (6%) e diminuído nas regiões Sul (9,3%) e, principalmente, Nordeste (44,2%), e o único centro de transplante hepático da região Norte, no Acre, permaneceu ativo. O transplante cardíaco apresentou pequena queda na região Sudeste (10,5%), moderada nas regiões Sul (33,3%) e Centro-Oeste (38,9%) e elevada na Nordeste (63,4%).
O transplante pulmonar foi realizado em apenas dois estados e houve diminuição em ambos, SP (17,4%) e RS (33,3%). A queda no número de transplantes de pâncreas, em suas três modalidades, ocorreu em todos os estados, com exceção do RJ, que apresentou crescimento de 33,3% no período. O ingresso em lista de espera, comparado com o primeiro semestre de 2019, foi menor para o fígado (13,1%), rim (14,5%), pulmão (18,2%), coração (20%), pâncreas (47,2%) e, principalmente, córneas (66,9%).
Este semestre foi, portanto, muito difícil e, graças aos esforços das equipes de doação e transplante, essa atividade essencial para milhares de pacientes no país, manteve-se ativa. Sabemos que, no próximo trimestre, teremos dificuldades maiores em algumas regiões, que estarão no auge da crise do Covid, mas, as equipes das outras regiões, que já passaram por essa fase, deverão retomar suas atividades e manter as taxas de doação e transplante estáveis, no Brasil. Bom segundo semestre a todos, e cuidem-se.
Por: Valter Duro Garcia - Editor da Revista Brasileira de Transplantes.
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